Depois há as banalidades de todos os dias, daquelas que se dizem no elevador e, por outro, as partilhas de sentimentos e desabafos de que ninguém realmente quer saber, a não ser por curiosidade ou porque, quase sempre, sente ansiedade e não se quer sentir só. Racionalmente, sinto que sei isto. Mas o Facebook, nas suas vantagens óbvias, é como os cigarros: fazem mal e sabem bem para alguns, fazem e sabem mal para outros. Eu até gosto do Facebook e das pessoas. Só não gosto é das inundações, dos fluxos, dos tsunamis informativos. Ninguém comporta tanta informação sem se ressentir, sem se isolar, julgando-se muito requisitado, admirado, lido, interessante. Dali a segundos, já ninguém se lembra o que postou A, B e C ou se morreram quatro ou dez pessoas no corrente dia. E de quê, já agora? Quanto mais alienados, mais vorazes.

E um dia, num dia como outro qualquer, em que senti a minha desconexão comigo própria no auge, não tomei uma decisão. Assumi-a de uma vez. Deitei o relógio ao chão e pisei-o. Depois saí para a rua e fui ver o sol. Oh, chamem-me inocente mas fui ouvir os pássaros e os zzzzzz apaziguadores das abelhinhas. Fiz de propósito e meti-me pelas ruelas mais estreitas da minha terra. Optei por ir pelos locais onde pudesse ouvir os meus pés a pisar folhas e paus secos. Parei aqui e ali para ver as flores das giestas, as papoilas, as mimosas, algumas flores silvestres roxas cujo nome desconheço, chamadas por este quase- quase calor primaveril. Fiquei uns segundos a ver uma velha roda de um moinho que alguém pôs à venda. Passei por vários cães e todos se puseram a ladrar uns para os outros em rede (salvo seja), quem sabe avisando-se uns aos outros que um intruso ia passar. Era preciso cautela. Cautela comigo. Mas eu não. Nunca tive medo de cães. Na realidade, nem eles de mim. Continuei a caminhar sob o sol fraco da manhã. Fraco, mas luminoso. Fui à Igreja e fiquei lá menos de cinco minutos. O suficiente para encher o peito de ar e de outras coisas boas. Vi as casas rurais, a lenha de uns e de outros, os vasos, as cameleiras a largar camélias para o chão e alguns trabalhadores aqui e ali a fazer arranjos. Vi ovelhas a pastar, mesmo ao lado de um restaurante conhecido da região onde há sempre leitão, picanha e papas de sarrabulho.
A dada altura, já não sabia como chegar à estrada principal, mas segui o barulho dos carros e atalhei por onde me apeteceu. Parei num mercadinho cheio de gente velha e comprei kiwis, tangerinas, água, peixe fresco e leite. Despedi-me sem pressas e ainda troquei dois dedos de conversa com a dona, gente da minha comunidade real que tão bem conheço e tantas vezes descuro. Bem, não sei se descurar será a palavra certa, uma vez que o meu gosto pela conversa me leva a conhecer muito bem a rede que compõe a minha vida no campo. Andei o suficiente para uma primeira vez. Talvez dois quilómetros. Voltei a casa, tomei um banho, comi uma tangerina e vim trabalhar. É só isto, mais nada. Agora vou trabalhar. O Facebook? Lá está, assim como os meus amigos. E eu lá estarei, para o que for preciso. Eles sabem onde me encontrar e vice- versa. E não se surpreenderão se no caminho para minha casa, virem alguma má energia excedente que se volatilizou e se fez Natureza. Não passou para ninguém. Desapareceu".
Denisa Sousa/Projecto Cyrano
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